domingo, 19 de abril de 2015

No olho da rua, nua!

Andando pela rua, mulher tem que correr
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Andando pela rua, mulher vai trabalhar
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Sou mulher cansada de tanta invasão
Já chega, chega de fiu fiu
Sou mulher cansada de tanta invasão
Meu corpo, meu corpo é meu espaço. Sou mulher!

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Então, canta mulher!
Se liberta!
Então, vai ser mulher!
Se completa!
E assim sua alma vai falar...
E assim sua alma vai gritar...
Chorar não muda o sentido dos ponteiros!

Salve as Ayabás! Salve Oxum! Salve Iemanjá! Salve Obá! Salve Iansã! Salve Ewá! Salve a criação-molde de Nanã!
Salve a mulher... mulher da luta, mulher da rua, mulher do dia, mulher da resistência, mulher negra!
A rima é na rua, é toda hora, é toda nua, é toda gira. Salve!

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Não venda sua opinião
Seu corpo, suas regras
Se erga e vista o que quiser
Confie em você, mulher
Raiz, saber, poder e ação
O olhar da luta só vê quem de luta é

Mulher calada, cabeça baixa - Não!
Me fortaleci com força e fé, sou mulher!
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Hoje eu não seria nada se não fossem as guerreiras de outros tempos
O olhar da luta só vê quem de luta é

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua


(por Maíra Baldaia e Lucas Costa)

Espelho d'água

Ela tem um brilho no olhar que é só dela
Seu olhar silencia o meu
Sob uma boa luz seu rosto é tomado pelas mais perfeitas sombras
(Ah) o que faz dela mais bela ainda
Quando ela sorri é de peito aberto
Daquele jeito assim que só se vê quando carrega verdade na alma

Quando o segredo das entrelinhas e das linhas das suas mãos
Já não é mais segredo
Os versos escorrem do sol
Quebram ondas na retina
E ela lá, caminha...

Ela tem um olhar que chora e que é só dela
Apesar de tantos e de tudo
Ela quer ter pra quem cantar
Quer ter por onde ensolarar

Quando o segredo das entrelinhas e das linhas das suas mãos
Já não é mais segredo
Os versos escorrem do sol
Quebram ondas na retina
E ela lá, caminha
E ela lá, só, caminha.
E ela lá, caminha...

Avoadeira

Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!
Beber do simples
Espiar o mar
Sereia da noite espreita o caminhar
Crescer no embalo
Se transformar
Sorriso é coisa da gente não largar
Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!
Leva na mala todo aquele céu de chita
E segue a trilha de mãos dadas
No presente faz a rima
Ôh, nega!
E quando pousa é o destino que se pinta
Dança pela entrada azul e branca
Olhar de quem acredita
Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!

Canto da pedra que brilha


Por ser de lá que eu não ando sem os pés no chão
Que eu não faço todo dia menos de uma oração
Por ser de lá que eu não deixo de olhar o tempo
Que o vento brilha reluzente em pedras no chão
A pedra no caminho só ergue
Um coração que é de poemas não se esvai
A pedra de Drummond não é só dele
É canto de um povo e esse povo não morre mais 
Por ser de lá que eu me miro em pôr-do-sol
Por ser de lá de onde as pedras sempre brilham
Que eu não respiro, mas não deixo de caminhar
Num desatino nunca deixo de sonhar
Por ser de lá que eu não brinco em conversa mole
Mas o riso frouxo também vem me acarinhar
Por ser de lá é que eu peço todo dia
Pro pensamento não deixar de me avoar

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Ainda sobre muros

Ora tenho vontade de escrever ora tenho vontade de chorar...
Não consigo, mas pelo menos chovem mundos lá fora.
Ando triste por aí, remando no mormaço, tentando não ser, tentando não estar, driblando as partes que me faltam.
Tenho saudade dos pés na areia, da água embalando tudo, dos sorrisos escancarados e sem autoridade.
Há tanta poeira embaixo dos tapetes, há tanto o que conversar, mas diálogo convém?
Olhares falam muito, silêncio também.
Silêncio corta ou cura?
A menina me ronda... quero ou não quero? Posso ou não posso? Tenho escolha? Missão.
O menino me ronda... quero ou não quero? Posso ou não posso? Tenho escolha? Missão.
Li sobre liberdade em algum lugar, liberdade quebra tabus...
Por que tudo passa por liberdade? Temos alguma liberdade de expressão?
Minha cabeça borbulha e meu ombro dói, mesmo o peso do meu mundo sendo dos mais leves. Imagina só...
O silêncio corta ou cura?
Quem vai ganhar as eleições presidenciais?
Quem vai reconstruir os laços e derrubar os muros?
E o afeto vai com quem?
Vai votar em quem?
25 anos: caía o muro de Berlim.
25 anos: e ainda não aprendi a ser criança.
25 anos: cheguei e estou buscando meu eu.
25 anos: tanta gratidão, tanta decepção, tanto perdão a se dar, tantos sonhos ou nem tantos assim.
2014 é mesmo de Vênus?
Sim, meus textos falam muito de mim (ou do que estou procurando).
Escrevo a mão para depois queimar.
A arte é como lamparina, sigo na rima.
O silêncio corta ou cura?


segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Ich liebe dich, mein schatz! Ich liebe, Berlin! Ich heiße Saudade!

Estava eu a voar entre dois homens, fartos homens. Eles não sabiam de nada.
Chorei entre dois homens fartos.
Chorei de saudade do homem que ficava em terra firme. Só ele sabe me entender com tantas rasuras.
Saudade arranca a alma da gente ou a coloca no lugar?
Sim, é uma pergunta!
E, sim, tanta sede é uma surpresa. Havia um mar entre nós dois, mar de tantos carmas e de tantos sonhos.
Chorei com os olhos que viam aquele lugar que ele sonhava em ver.
Inexplicavelmente, lá do outro lado do mundo, em calçadas que ele nunca andara, cada pedaço de gente/de sonho/de pedra era a memória dele.
Não sei o que trarei de volta. Talvez saiba: um mar, olhares alemães, turcos, árabes, brasileiros, brasileiros repletos de buscas... Os olhos de uma menina que não se sentia completa cativaram meu afeto... Eu era um pedaço solto e incompleto a reconhecer pedaços de ruínas, de muros, de arrimos, de reconstruções. Pedaço cheio de saudade, essa palavra engraçada de tão dolorida.
Os pedaços de muros estavam por todo lado, ainda latentes, fortes nos olhos daquela gente. Gente apressada e objetiva. Gente dos olhos cheios de amor e dos pés sedentos por um convite à dança.
Meu peito remexido cantou saudade todo o tempo, é preciso ser forte para aceitar novos caminhos, desatar nós sem deixar de se ter o carinho – aquele incondicional.
Meu canto quer derrubar todos os muros.
Ás vezes os muros estão tão perto, entre abraços dos que mais amamos. È preciso desatar os nós para derrubar os muros, é preciso seguir em frente e, sobretudo, seguir acreditando que o que te mói o peito não ergue felicidade. Saber dizer adeus também é uma forma de encontro.
Choro na volta, de saudade dos sorrisos que ficaram em Berlim e de saudade de mein schatz.
As pessoas nos tocam sem nem saber e nem sempre eu sei demonstrar o quanto gostaria de cativá-las... Tenho cá comigo um sorriso calado, mas minha pele sente tudo.  Pé de vento diz até breve.
Tenho sede daquele abraço que me compreende. De todos os olhares ternos que encontrei no mundo, o do homem com quem caminha meu pensamento é o que mais me fez querer ser doce. Mein schatz é um espelho do meu lado bom. A bondade é de longe o seu maior legado em mim.

Sigo aprendendo a sorrir enquanto choro.

Berlim me ensinou muito de mim e as pessoas que ficaram lá são a lembrança mais preciosa desse voo, nem pimenta tira a doçura que a generosidade proporciona (ou generosidade é refresco para todo e qualquer olhar).
Estranhamente, a meu modo, a meu tempo e em minha dureza cada vez mais malemolente eu absorvo e observo.

Agradeço um tanto.

terça-feira, 22 de abril de 2014

Eu não sou de Vênus

EU NÃO SOU DE VÊNUS.

Perdão, perdão meu eu.
Perdão, meu coração apertado e empoeirado.
Eu não quis te desfolhar. É que...
Os dias ardem por aqui e de repente nuvem.
Nuvem negra na cabeça faz chover tanto céu.
É muito céu pra pouco suportar.
Que desatino, o pé lateja, mas não para de caminhar.
Que desritmado, doem os ossos, mas não para de caminhar.
Que desilusão, que desapego, que desajeito...
Desprevenida a buscar o que machuca, vê se para...
Para de ser deusa, para de remoer o velho, vê se liberta esse velho...
Deixa a chuva cair.
Perdão, perdão meu eu.
Lá fora a chuva, aqui dentro a confusão.
Se segura menina, não siga insegura por aí.
Os dias fecham por aqui, o ano é do deus dos raios, ele é quem rege.
A justiça faz vistas de alcançar futuros, o velho já não há.
Eu não sou de lua, eu não sou de sol, eu sou de um tudo.
Eu sou de um tanto que assusta e acolhe na mesma profusão.
Eu sou de um tanto que cala e grita na mesma proporção.
De onde eu venho não tem boleros densos, não tem palavras difíceis, não tem sei lás... É tudo quase ingênuo, meio pedra bruta, sabe?
Só me responde por que a chuva cai bem na hora que a gente chora.
Eu sou qualquer coisa, não me pergunte não.
Se ler meus olhos verá que só busco verdades, se sincero não dói tanto.
Se sincero não sobra espaço pra fingir dor...
Ah, doce herança fatigada.
Eu deixo o velho ir e alegremente dou boas vindas ao novo.
Eu me perdoo, eu me amo, eu.
Eu sorrio num quase, enquanto a tempestade lava o que há em volta.
Engraçado.